(Extraída do Livro Frei Fabiano, do Fr. João José P. Castro)
Nasceu na pequena aldeia de Soengas, na antiga província do Minho, em Portugal, em 8 de fevereiro de 1676, recebendo o nome de batismo de João Barbosa. Seu pai chamava-se Gervásio Barbosa.
Era João, em criança, o encarregado de levar as ovelhas de seu pai ao pasto e as conduzir ao redil. Como pastor, teve ocasião de desenvolver a natural bondade do seu coração, como mais tarde patenteou, cuidando das suas “ovelhinhas” sofredoras.
Mais crescido saía com o pai ao campo, ajudando-o nas plantações e outros trabalhos da lavoura.
Já adolescente compreendeu que, como lavrador, dispondo de poucas terras pouco ou nada conseguiria, mesmo que nesses trabalhos consumisse todas as suas forças.
Dando-se à vida de negociante, podia expandir-se, empreender, arriscar, ganhar e, deste modo, a seu ver, vir a ser grande.
Rumou para a cidade do Porto onde entrou em contato com o mundo, que até então ignorava, e se dedicou ao comércio.
Nessa cidade muito se falava, como em todo o Portugal, das fabulosas minas de ouro e outros metais preciosos ocultos no solo do Brasil.
Uma vez concebido o plano de passar-se ao Brasil, nada o deteve.
Desvencilhando-se de tudo, disse adeus aos pais e irmãs e, com o cabedal que lhe foi possível angariar, confiou-se às desafiadoras vagas do oceano.
Decorridos os meses da travessia, aportou João ao Rio de Janeiro, capital da então vastíssima Capitania desse nome.
Passados os dias necessários para refazer-se da viagem, demandou à zona aurífera do Ribeirão de Nossa Senhora do Carmo (Mariana) e Ouro Preto, após enfrentar inúmeras dificuldades próprias dos caminhos daquela época.
Em poucos anos João Barbosa tornou-se senhor de pequena fortuna, mas longe de contaminar-se com a exaustiva lide dos negócios, se lhe aperfeiçoou a generosidade no sacrifício, se lhe deparou enfim a melhor escola para a vida de devotamento que mais tarde levaria.
Após alguns anos de comércio ambulante pela "Carreira das Minas", João Barbosa fixou residência na Vila de Parati.
Como em Minas, também em Parati, mostrava-se solícito em ganhar, não perdendo ocasião de um bom negócio. Nem por isso, contudo, se engolfou de tal modo nos negócios que não lhe sobrasse tempo para cumprir seus deveres para com Deus e para com a alma.
Os pobres sabiam que em sua porta não bateriam em vão. Sua bolsa estava sempre pronta para ajudar a quem dele necessitasse.
A luz sobrenatural da fé o foi iluminando interiormente e conheceu sempre mais nitidamente onde podia encontrar a única verdadeira grandeza.
Achegava-se sempre a Deus e quem de Deus se achega forçosamente sera iluminado de sua eterna verdade.
Do conhecimento que adquirira das ninharias das riquezas e honras terrestres originou-se-lhe o mais ardente desejo de viver só para Jesus Cristo, a quem, despido, pobre e obediente se propunha servir no estado religioso.
Para dar desempenho aos seus propósitos escolheu a Ordem Seráfica de São Francisco de Assis, tendo sido admitido em 8 de novembro de 1704 no Convento de São Bernardino de Sena, em Angra dos Reis, após repartir tudo quanto em anos de contínuo labutar havia conseguido.
Em seu zelo e ardor tudo lhe ia agradando sumamente. Nenhuma dificuldade parecia encontrar em sujeitar-se à observância ou aos atos de penitência.
Em 11 de novembro recebeu o hábito, o cordão e capucho franciscanos, começando como Noviço nova vida.
Cumpria todas as ordens com a maior exatidão, embora em seu fervoroso espírito nunca lhe parecesse que fazia bastante. Ninguém era mais desejoso de atos de penitência e humilhações.
Os superiores viam nele o modelo de todas as virtudes, podendo, ao fim do ano de noviciado, formar dele o juízo certo que "desse Religioso Deus colheria um verdadeiro Servo".
Em 12 de novembro de 1705, terminado o noviciado, João recitou solenemente a fórmula da Profissão, "sacrificando-se a Deus em religiosa obediência, pobreza e castidade, com grande júbilo de sua alma."
Foi-lhe dado nesta ocasião, em vez de João, o nome de Fabiano e o nome de Barbosa foi mudado para o de Cristo.
Avaliando-se o Pe. Provincial a sua acrisolada virtude e compreendendo que nele podia depositar ilimitada confiança, transferiu-o em fins de 1705 de Angra dos Reis para o Convento de Santo Antônio no Rio de Janeiro, dando-lhe, aí, como irmão leigo, o difícil cargo de porteiro. Segundo as leis da Província, só deviam exercer esse cargo religiosos de muita prudência, confiança e virtude, após 15 anos de hábito. Incumbia-lhe como tal, de modo particular o cuidado dos pobres e mendigos que em não pequeno número iam bater à porta do Convento. Em Frei Fabiano achavam os pobres um amante Pai.
Todos os deveres do porteiro eram cumpridos à risca e com a maior perfeição.
Apesar dos excelentes frutos que colhia no seu mister, relativamente pouco tempo aí permaneceu.
Essas mesmas exímias qualidades que dele faziam porteiro modelo, recomendavam-no para outro cargo em que iria de então em diante consumir toda a sua vida, o de enfermeiro.
Não levava Frei Fabiano consigo nenhuma formação ou preparação para o novo ofício. Acompanhavam-no unicamente boa vontade e admiravel prontidão além de uma absoluta confiança na Providência Divina. Com os anos tornou-se mestre no ofício e tratava os doentes com exímia paciência, caridade e paternal solicitude.
Companheiro inseparavel dos doentes, vivia como que encerrado na enfermaria,acudindo de leito em leito. Aí passava os dias e muitas vezes as noites só se retirando quando os enfermos lho permitiam para prolongadas horas de oração.
Por muitos anos nenhuma cela teve, pois em qualquer canto da enfermaria repousava durante as poucas horas que concedia ao sono.
Os anos foram passando e Frei Fabiano de Cristo nesse ministério de enfermeiro ia consumindo quase todo o restante da vida, cerca de 38 anos.
É conhecida verdade em ascese cristã, que Deus faz sofrer àqueles que ama de modo particular. Enviou Deus a Frei Fabiano incômodos físicos mais pungentes, que por mais ou menos 30 anos o cruciaram e consumiram quase sem tréguas.
Quis assim o Altíssimo acrisolar a virtude do seu Servo. Consistiam essas doenças, antes de tudo, numa erisipela, ao que parece crônica ou intermitente, que lhe ocasionava cruciantes sofrimentos. Localizava-se o mal nas pernas. Na perna direita se lhe originou uma grande e horrosa chaga, que vertia continuamente copioso pus. Tambem lhe apareceu um quisto em um dos joelhos, talvez em conseqüência das longas horas que costumava passar ajoelhado.
Apesar do seu incessante sofrimento jamais se lhe podia ouvir dos lábios a mais leve queixa a não ser que a doença lhe impedia, às vezes, o desempenho exato de seu cargo.
Nos últimos anos começou Fabiano a sofrer horrosamente de hidropisia. Encheram-se-lhe as pernas de serosidades e humores mórbidos com atrozes dores.
Suas excelsas virtudes, porém, jamais se arrefeceram e seguia Fabiano as pegadas de Francisco de Assis, esmerando-se com admirável constância e fortaleza no espírito de penitência e na prática da mais inexcedível e inalterável bondade, como na caridade mais pura e sobrenatural. Encontrava em Deus pelo profundo conhecimento que D'Ele adquirira, tudo quanto sua alma podia almejar.
Já septuagenário, ia tocando o termo de sua vida, tendo passado a maior parte dela na Religião. Alem de tolerar com insistente paciência os dilatados achaques e dores de suas enfermidades, esforçava-se, ainda a macerar e subjugar o seu pobre corpo por toda sorte de austeridades.
Agora, pois, prestes a deixar este mundo, considerando este feliz "martírio" , sua alma podia abrir-se toda à esperança e prelibar ainda em vida a eterna beatitude.
Em outubro de 1747, se agravaram os incômodos que já há muito tempo vinha sentindo, provenientes da erisipela. O bom irmão conheceu perfeitamente e, como dizem, por uma revelação divina, que ia chegando o fim do seu desterro e anunciou-o aos seus confrades, precisando o dia e a hora.
Tendo-se conformado em vida inteiramente e sempre à Vontade de Deus, também na decisiva hora recebeu a graça não só de resignação perfeita, mas ainda de sincera alegria ante os desígnios divinos. Para ele a vida era Cristo e a morte lucro, anelava para que se lhe dissolvesse o invólucro desta vida e pudesse estar com Jesus Cristo.
Amanheceu por fim o dia 17 de outubro de 1747, terça-feira. O Divino Mestre achou por bem dar pausa nesse dia o dilatado tormento do seu Servo. E entre uma e duas horas da tarde, abraçado ao crucifixo, Frei Fabiano de Cristo entregava placidamente sua bela alma nas mãos do criador.
Alguns sinais prodigiosos sobrenaturais ocorreram após o falecimento de Fabiano de Cristo, tudo levando a crer que nesses prodígios se revelava o Dedo de Deus, querendo glorificar na Terra o seu humilde Servo: O cadáver de Fabiano manteve flexibilidade por mais de trinta horas, quando o normal é acontecer a rijeza cadaverica de 1 a 24 horas; os seus olhos permaneceram claros, límpidos e cristalinos como em vida, o seu semblante, passadas 2 horas e apesar do rosto lívido e amortecido de antes, devido à idade e os achaques, tornou-se alegre e risonho, com cores tão naturais como se estivesse vivo e assim se conservou até mais 26 horas; aberta uma veia do braço e feita uma cisura nas costas de uma das mãos, saiu sangue tão abundante, que dele se puderam ensopar alguns panos; o sangue líquido que emanava da horrorosa chaga da perna direita, de uma ferida que tinha nas costas e da chaga da cintura, originada do cilício , era copioso e cheiroso como odorífero bálsamo; quando foi aberta a campa da sepultura, dela saiu igualmente um suavíssimo perfume que se espalhou por todo o lugar em volta, de modo que todos os circunstantes o puderam sentir.
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Que a dignificante vida de Fabiano de Cristo, aqui tão resumidamente retratada, escolhido Patrono desta Instituição que se dedica à assistência aos necessitados, sirva de constante inspiração a todos nós que nela trabalhamos.